Temos de fazer uma mudança geracional e dar voz aos jovens

Abr 4, 2018

A duas semanas de viajar para a Guiné-Bissau, Teresa Damásio fala-nos da mais recente instituição do Grupo Ensinus naquele país, do que a leva a trabalhar por mais e melhor educação em Portugal, Angola, Brasil, Cabo Verde, Moçambique, São Tomé e Príncipe e agora na Guiné-Bissau. E do seu sonho para o futuro.

Os projetos tornam-se reais quando as pessoas acreditam e as equipas partilham. Teresa Damásio assenta a sua estratégia nesta certeza quando fala do IPT – Instituto das Profissões e Tecnologias, a mais recente Instituição do Grupo Ensinus. Em entrevista ao Link To Leaders, a advogada e professora universitária garante que, graças à sua equipa, vai ser possível colocar de pé esta Instituição que irá estar ao serviço de todas e de todos os guineenses já em setembro deste ano.

Com os olhos postos no mundo, Teresa Damásio quer, assim, apostar na internacionalização do Grupo Ensinus, onde é administradora delegada desde julho de 2016 e que é constituído por Instituições de Ensino Superior, o ISG, por Escolas Profissionais, o INETE, a Escola de Comércio de Lisboa e a Escola de Comércio do Porto, a EPET, o INAE, o IEG – em Moçambique, o Externato Álvares Cabral, o Externato Marquês de Pombal e o Colégio de Alfragide. Nestas instituições, a educação acompanha e reflete as principais preocupações da sociedade em constante mudança, garante.

O Instituto das Profissões e das Tecnologias é a mais recente instituição do Grupo Ensinus na Guiné-Bissau. O que mais pesou na sua tomada de decisão para uma melhor educação neste país?
Foram, nomeadamente, os estudos mais recentes feitos pela União Europeia e pela OCDE, e também naturalmente pelo governo português, acerca da necessidade que existe de termos em todas as sociedades, e muito particularmente naquela, ensino profissional de qualidade. Naturalmente que é muito importante haver Ensino Superior, mas quando temos franjas da população com um abandono escolar tão elevado, o que faz com que não se consiga ter metas satisfatórias na conclusão da escolaridade obrigatória, é importante trazer outro tipo de instituições para o sistema educativo.

A Guiné-Bissau já tem ensino profissional há muitos anos, mas escola profissional como aquela que idealizamos e que estamos a criar não existe. Estamos situados numa das zonas mais centrais de Bissau, no bairro da Ajuda, e onde está o chamado pólo universitário da cidade de Bissau. Quisemos com isso também valorizar o nosso Instituto, colocando-o numa área da cidade onde circulam alunos e professores o dia todo. Queremos dotar os jovens guineenses, que têm níveis assustadores de abandono escolar e níveis muitíssimo baixos de qualificação. Por outro lado, as qualificações que temos no Instituto advêm, mais uma vez, dos estudos internacionais que apontam um conjunto de áreas chave para a Guiné-Bissau e que “casaram” com aquilo que fazemos em Portugal. Temos muitas escolas profissionais que atuam nas áreas em que vamos atuar na Guiné-Bissau, com exceção da agricultura e das pescas que são dois cursos novos. Para nós, é muito desafiante do ponto de vista do projeto, porque são áreas completamente novas, que não temos nas nossas escolas.Mas todas as outras áreas já temos há 20/30 anos e, portanto, estamos completamente à vontade.

Já há datas para abertura do IPT na Guiné-Bissau?
Neste momento estamos numa fase que, para mim, é muito desafiante e aliciante, que é a instalação da escola, tendo como objetivo abrir no início de setembro. E vamos começar a recrutar alunos a partir do início de junho, na segunda quinzena. As obras já estão a começar e é muito gratificante ver o interesse que houve na sociedade guineense. Houve por parte da nossa embaixada um excelente acolhimento e também por parte da União Europeia. Uma das coisas muito importantes do nosso projeto é que vamos fazer “brain gain”. Vamos trabalhar com professores de lá e adaptarmo-nos à realidade local porque é, obviamente, uma escola pensada para a sociedade guineense. Temos um outro objetivo a médio/longo prazo: consolidar o IPT em Bissau e estendê-lo depois a duas outras zonas dentro do território da Guiné-Bissau, e avançar para a cooperação com os países da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO). O IPN arranca com 13 cursos com estágio integrado desde o primeiro ano.

Como vai ser gerir uma instituição à distância?
Já temos uma universidade e uma escola técnica em Moçambique, uma desde 1992 e a outra desde 2014. Temos um administrador delegado lá, assim como o corpo docente. Irá daqui um membro do meu staff para montar os serviços académicos. Estamos a trabalhar também em cooperação com alguns dos nossos diretores e professores da universidade que temos em Bissau. Aquilo que queremos é também uma cooperação vertical entre o instituto e a universidade. Hoje em dia, com as novas tecnologias, gerir à distância é muito mais fácil.

Quais os grandes objetivos com mais este passo?
Para nós, que somos lusófonos, é podermos capacitar os cidadãos guineenses da língua portuguesa. Vejo o IPT como mais uma instituição de ensino no espaço da CPLP, num país que está também dentro da CEDEAO. E, portanto, isso dá-nos responsabilidades muito elevadas porque vamos estar a ensinar em língua portuguesa. Mas temos como segunda língua obrigatória em todos os cursos e em todas as qualificações, a língua inglesa. E aqui demos um passo em frente, porque podíamos ter escolhido a língua francesa, que é a língua oficial da CEDEAO, do Senegal e da Guiné-Bissau, mas escolhemos a língua inglesa porque estamos num mundo globalizado. A globalização fez-se em língua inglesa e nós queremos dotar os nossos alunos com as melhores competências e aprendizagens. Teremos a língua francesa no curso de Serviços Jurídicos e de Registo e Notariado. O que queremos é que o aluno saiba falar e escrever bem em português e em inglês. Teremos um laboratório de línguas. Estamos neste momento a mandar o material todo, as cadeiras, as mesas os computadores, as canetas… tudo.

Queremos que no fim do mês de maio o Instituto esteja todo montado. Uma colaboradora minha irá para lá três semanas e quando eu for lá no dia 17 de abril já terão a Secretaria pronta. Somos uma equipa muito jovem. Uma coisa que quero mostrar com o IPT, e que devia ser comum a todas as empresas, é que de facto temos de fazer uma mudança geracional e dar voz aos jovens. E na Guiné-Bissau há um problema terrível com os jovens que 75% das vezes não veem uma luz para o seu futuro. Por isso, temos lá uma equipa jovem, que mostra que é capaz de fazer. Temos um arquiteto, o construtor… O edifício é muito grande e, numa primeira fase, vão estar prontas sete salas. A segunda fase, ficará para o próximo ano letivo. Estamos a concorrer também a fundos da União Europeia e vamos abrir só o primeiro ano. São sete qualificações, sete salas e no decurso do ano letivo começaremos as outras salas, com o objetivo de em setembro de 2019 ter o edifício todo reabilitado e capacidade instalada para 17 salas.

Tem a equipa toda mobilizada…
A equipa está todo mobilizada com este projeto da Guiné-Bissau porque este instituto é filho do INETE. A lei guineense permite que se criem sucursais, portanto, nós não criamos uma empresa nova, mas sim uma sucursal do INETE, onde nomeámos como administrador delegado o Dr. Martilene dos Santos. A diretora do INETE, a Dra. Fernanda Torres, também vai lá para estabelecermos os protocolos. Ou seja, isto tudo já foi apresentado na reunião geral de grupo Ensinus, todas as diretoras estão a par do que se passa, todas conhecem as qualificações. A informação é transparente e transversal.

Já tinha sido pensado há muito tempo a abertura do Instituto?
Não, é recente. A ideia surgiu no final de janeiro. É muito interessante ver a forma como as autoridades, quer nacionais quer internacionais, receberam o projeto. De facto, os governos, tal como agora em Portugal, perceberam finalmente a importância do ensino profissional. Por outro lado, na Guiné-Bissau neste momento não existe governo, mas a sociedade está toda a funcionar e isso é muito interessante. Já temos um diretor pedagógico que vai estar connosco para ter formação. O que para mim é fundamental é que todos os que trabalham connosco percebam os nossos valores e a nossa missão. Sem formação não se consegue explicar isso às pessoas.

Depois do Instituto estar pronto qual será a capacidade de alunos que pode albergar?
Perto de 500 alunos. É um número muito bom. Também já estamos a pensar em expandir dentro de Bissau para uma parte limítrofe junto ao aeroporto. Tudo isso por causa da agricultura. Quando temos um projeto temos de pensar a médio/longo prazo. Não podemos dizer só: quero abrir um instituto. E depois? Temos de abrir dentro de Bissau, depois dentro da Guiné-Bissau e depois ir para o Senegal. Já estamos com encontros nesse sentido, com o Presidente da República. Os projetos tornam-se reais quando as pessoas acreditam e as equipas partilham!

Então o próximo passo poderá ser o Senegal?
É Dakar. É muito importante esta questão da mudança geracional. Essa é uma preocupação que já transmiti à equipa de Bissau, nomeadamente ao corpo docente. Tem de ser um corpo docente jovem. Se queremos que a sociedade evolua, se queremos de facto fazer a mudança, tem de se trazer as pessoas que trazem inovação, criatividade. Os mais velhos trazem experiência, têm um legado, mas precisamos de dar lugar aos mais jovens. Se na Europa isso é um problema, então em África é um problema maior porque os mais velhos não deixam os mais novos terem voz.

A Teresa gere um grupo com 13 instituições – além do ISG e de dois estabelecimentos em Moçambique, o Ensinus integra também o INP, a Escola de Comércio de Lisboa, a Escola de Comércio do Porto, o INETE, o EPET, a INAE , o Colégio de Alfragide e os Externatos Marquês de Pombal e Álvares Cabral. Quais têm sido os seus grandes desafios?
O projeto piloto da autonomia e da flexibilidade curricular, que conseguimos que o Governo autorizasse nas nossas escolas profissionais, porque era só para o Ensino Científico/Humanístico, e nós temos as nossas escolas do Ensino Científico/Humanístico a participar, e o rebranding de todo o grupo. Quando entrei, em julho de 2015, tinha esse objetivo e fizemos o rebranding no dia 2 de março de 2018. Era muitíssimo importante criar um espírito de união entre todos os dirigentes e conseguimos com muita formação. Contratámos o professor Xavier Aragay para nos ajudar a criar o perfil de pessoa que nós temos no grupo Ensinus. E vamos publicar um livro com ele em junho de 2019. Já estamos a trabalhar nisso, para deixar escrito, para memória futura, aquilo que é a nossa missão e que tipo de cidadãos educamos no grupo Ensinus.

Quando foi eleita em julho de 2016 administradora do grupo Ensinus, a Teresa imprimiu, desde o primeiro instante, uma liderança com cunho feminino. Tem sido fácil promover o empoderamento feminino?
Tenho a sorte de ter muitas dirigentes mulheres. Quase todos os diretores são mulheres. A minha equipa, com exceção do diretor jurídico e informático, são mulheres. Se é fácil? Não, eu acho que é sempre difícil. Ter de provar permanentemente que as mulheres conseguem gerir, liderar, tanto ao nível da equipa dirigente como nas chefias intermédias, é um dos maiores desafios. O que importa é que elas não se apercebam disso, ou seja, que sejam permanentemente empoderadas e daí a minha quase obsessão pela formação. Diria que todos os meses 25% do tempo delas é em formação. E eu quero que continue a ser assim, porque só assim conseguimos empoderar as mulheres cada vez mais.

A Teresa faz questão de ter reuniões semanais com a sua equipa. O que considera que tem contribuído para o sucesso do trabalho que tem desenvolvido?
A organização, ou seja, temos uma agenda até julho, todas as pessoas têm conhecimento da agenda, todas as pessoas participam na agenda. Nas escolas, não são só os professores que participam na vida da escola, mas também corpo discente. Como aqui no ISG, também temos reuniões mensais. Para além das reuniões dos dirigentes, tenho reuniões dos professores por áreas de grupo. Ou seja, se neste momento perguntar a alguém dentro das nossas escolas o que é o grupo Ensinus, essa pessoa saberá responder. Se perguntar quais são os valores, ela saberá dizer, se perguntar o que vamos fazer em abril e maio, também saberá informá-la.

Só venceremos se tivermos um forte espírito de equipa e de união. Sem isso não iríamos conseguir porque a educação é um mercado muito competitivo. Precisamos de alunos, de ter a confiança das famílias, da tutela, trabalhamos em muitos projetos internacionais e temos também a confiança da União Europeia, de todas as embaixadas. Para continuarmos a evoluir como grupo temos sempre de introduzir a inovação, a criatividade e deixar os dirigentes sonharem. Para eles sonharem, tenho que lhes dar formação para poderem ver as coisas de outra maneira. Por outro lado, gosto muito que pensem todos de maneira diferente, porque isto não é nenhum rebanho. Somos um grupo, não somos um rebanho. Para isso é importante estarmos juntos.

A Universidade Lusófona celebrou 20 anos. 20 anos depois, que balanço faz da instituição?
O termos levado a Educação a todos os países de língua portuguesa e a nossa rede de alumni que temos espalhada já em todos os países de língua portuguesa e já demos o salto para a francofonia, e isso, de facto, enche-nos de orgulho. Mas 20 anos em Educação é muito pouco e temos, lá está, a grande responsabilidade de prever o futuro. No grupo Ensinus todos os dirigentes entregaram um envelope fechado com o nome do seu sucessor, da pessoa que gostavam que lhes sucedesse. As pessoas podem reformar-se, podem querer ir fazer outra coisa… No princípio as pessoas não acharam muito bem, achavam que estava a ser despedidas…nada disso. É uma questão de dizerem quem querem que lhes suceda, daqui a um ano, daqui a cinco, a 10, depois de dizerem que querem o A ou o B têm de treinar essa pessoa.

A Teresa está convencida de que no pós-2020 não haverá financiamento para as escolas profissionais. Daí a meta traçada que em 2019/2020 tem de ter, nas escolas profissionais, 50% de autofinanciamento. O que é preciso fazer?
Aumentar as atividades de autofinanciamento dentro das escolas, aumentar a ligação às empresas que no ensino profissional existe mercê dos estágios, mas temos de ir um bocado mais além, temos de fazer formação, ter projetos de investigação, temos de nos candidatar a tudo e mais alguma coisa que apareça, e é isso que já estamos a fazer. Eu tenho como meta, já no próximo ano, ter 50% do orçamento em autofinanciamento. Porque o ensino profissional em Portugal é 100% financiado pelo Estado e se o financiamento acaba, fecham-se as escolas e, obviamente, que não vou fazer isso. Esse foi outro dos desafios, meter isso na cabeça dos nossos dirigentes.

Aqui no ISG tivemos o melhor ano desde 2007 /2008. No ensino profissional, o desafio é conseguir outras formas de financiamento para manter a escola sustentável e só através de projetos, como, por exemplo, o Erasmus+. Candidatámo-nos agora a uma série de ações no KA2 [Parcerias Estratégicas apoiadas pela Ação-Chave 2 (KA2)], aumentámos significativamente em duas das nossas escolas a formação a empresas, temos neste momento cursos a decorrer em paralelo às nossas aulas em horário pós-laboral. Mas também aí a competição é muito grande e também por causa da crise económica, muitas empresas começaram a fazer a sua formação in house. E para isso tenho de ter os dirigentes na rua, a falar com as pessoas.

Quais são os passos do ensino no futuro e do Grupo Ensinus?
Do grupo Ensinus é a internacionalização. É um passo que considero obrigatório. No ISG temos já uma turma completamente internacional, totalmente lecionada em língua inglesa, e para o ano estamos em condições de conseguir abrir mais uma turma e talvez uma terceira. E queremos também internacionalizar o grupo. Em relação à educação, acho que tem de se tornar global e muita coisa tem de mudar no ensino em Portugal.

Com tantos desafios, como consegue gerir o seu dia?
Com organização. E também porque gosto muito daquilo que faço. Tenho mesmo de ter ideias novas todas as semanas, se não morro. Ou seja, neste momento estamos a fazer este projeto na Guiné-Bissau, estamos com o advogado lá, mas já estamos a tratar do projeto do Senegal. E tenho um sonho, que hei-de cumprir um dia, que é o de abrir uma escola num outro país da África Ocidental, por exemplo, em Marrocos. É outro projeto que neste momento está um pouco de lado, porque agora tenha a questão do Senegal. O que eu quero é que o IPT seja no fundo uma plataforma giratória para estes países todos. Vai ser o ITP que vai abrir estas escolas todas e também temos a sorte de ter uma excelente equipa na Guiné-Bissau.

 

Artigo publicado a 4/04/2018 em Link to Leaders

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